Polly Gray (Nascida Shelby) – Psicanálise de Karen Horney
- Marcos Vinicius
- 1 de ago. de 2020
- 3 min de leitura

Parece uma avaliação ampla demais, mas não deixa de ser verdadeira: a Inglaterra do séc. XIX em época de guerra é mãe de muitas neuroses. Com alguma segurança, mas correndo o risco de generalizar pode-se dizer que, em linhas gerais, todos os Peaky Blinders são neuróticos a luz da psicanálise. Polly Gray, assim, é uma das representantes neuróticas da ilustre família Shelby.
A análise seria muito previsível se partisse da sexualidade clássica de Freud para abordar uma personagem com inúmeras declarações e cenas sobre sua vida erótica. Além de previsível seria injusto, porque o corpo de Polly está no lugar que sempre deveria estar: sob sua tutela para que ela o use como quiser, tanto que usa como arma para seduzir e chantagear. Como alternativa, no entanto, para não ter que explicar a inveja do pênis e outras categorias psicanalíticas controversas, parte-se de outro ponto: uma neofreudiana mulher para analisar uma personagem feminina, Karen Horney.
Karen Horney sintetiza o drama da psique humana como sendo uma trindade que se implica e se resolve, produzindo nessa dinâmica a personalidade. Essa dinâmica se dá socialmente e não instintualmente, ou seja, para Karen Horney a cultura e o ambiente desempenham papeis importantes. Ao longo da explicação dessa trindade vamos desenhando a personalidade de Polly.
Essa trindade é composta primeiramente pelo Mal básico do mundo, em que existe tudo de ruim e danoso para a psique: o desprezo, a rejeição, a superproteção, a discriminação, a injustiça etc. Sendo mulher, cigana e em tempos de guerra, Polly está inteiramente exposta ao Mal básico do mundo. Essa exposição constante e profunda ao Mal fez com que Polly desenvolvesse habilidades sensórias extras, o que faz com ela tenha uma espécie de mediunidade.
O Mal básico gera nas pessoas um incômodo e uma inquietude profunda: a Ansiedade Básica. Essa é a segunda parte da trindade: um sentimento de vulnerabilidade e insegurança marcantes que precisam ser resolvidos de alguma forma. Lidar com essa ansiedade básica é a luta diária e constante do humano contra sua condição de desamparo. Na realidade da Polly, por exemplo, algumas vezes podemos vê-la sendo consumida pelos seus próprios demônios (A infância cigana, o marido que fugiu, os filhos que foram roubados e inúmeras outras histórias traumáticas) que a fazem lembrar de sua ansiedade básica.
A resposta dada a essa Ansiedade básica causada pelo Mal básico é a estratégia fundamental da personalidade e que orienta todos os comportamentos e decisões. Essa Estratégia é a última parte da trindade e busca resolver o dilema. Todos lidam com esse dilema, no entanto, quando essa estratégia é irracional ou parcialmente irracional diz que é uma estratégia neurótica. Karen Horney levantou 4 tendências de personalidades neuróticas, as quais dependem essencialmente se o neurótico se aproxima, se afasta ou vai contra alguém: a) Aquiescência, b) Retraimento, c) Agressão, d) Alienação
Não cabe analisar cada uma dessas tendências, mas a solução neurótica de Polly é do tipo Agressivo que vai contra as pessoas e busca expansivamente no mundo resolver seus traumas. Quase todos os Peaky Blinders compartilham esse traço neurótico. Dessa maneira, para retomar um pouco do que foi dito no início, podemos dizer que a sexualidade de Polly, longe de qualquer inveja do pênis, é na verdade parte da sua estratégia neurótica global agressiva para resolver seu dilema da Ansiedade Básica.
Análise por Marcos Vinicius Cieri de Moura
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